SOBRE A ARTE ETÉREA DE RICARDO ALVES


“O bom design é arte” disse uma vez Tadeu Chiarelli justificando a exposição dos Irmãos
Campana no MAM em 2000. A frase dele é curiosa porque sinaliza que nem todo design é arte.
Seu rigor é notório, de fato é muito raro aquele curador expor obras de design industrial, sendo
sua atuação francamente voltada para a arte contemporânea e moderna. Não há espaço para o
design na arte contemporânea brasileira, sendo aquela a exceção que confirma a regra. O
designer gráfico Almir Mavignier também expos no MAM no mesmo ano. Sua exposição continha
quatro grandes paredes forradas com centenas de posters emoldurados, de várias empresas e
eventos, concebidos pelo artista ao longo de décadas. Mais um exemplo incomum de design
alçado à condição de arte.

O artesanato eventualmente também é considerado arte, como demonstram as apropriações de
Nelson Leirner: peças de criatividade manual vindas de outro contexto. Despertam interesse, não
apenas como apropriações de readymades mas, como manifestações de arte popular,
produzidas em série, com simplicidade conceitual e despretensão, duas qualidades raras nas
artes. O design e o artesanato são duas expressões de forte orientação comercial, ja a arte
contemporânea nem sempre. Por isso a dificuldade financeira da maioria dos artistas. É comum
artista produzir sem ganhar nada, expor em grandes eventos sem nenhum tipo de ajuda de custo,
e até pagar para expor. Claro que é o mercado de arte quem pauta todo o circuito e os acervos,
mas nem sempre o destino imediato da obra é o mercado. Com frequência a obra é destinada
simplesmente à exposição, à apreciação crítica, ou editais de programas culturais subsidiados ou
patrocinados. Por isso é difícil posicionar o design e o artesanato no circuito oficial de arte, são
linguagens muito distintas. Os artistas são submissos ao sistema de arte, os designers não.
Embora sejam submissos em outras rodas.

O trabalho de Ricardo Alves se apoia nestas três vertentes como um tripé: a arte contemporânea,
a arte gráfica e o artesanato. O componente artesanal, mesmo que hi tech usando arte digital, se
demonstra pelo afastamento inicial do artista frente ao circuito instituído de arte. Alves produzia
em completo isolamento, sem nenhum tipo de orientação condicionada pelas influências do meio
artístico. Deslocamento este que não era apenas físico, mas espiritual: suas composições
retratam, segundo ele, universos cósmicos, outros mundos. Já sua vertente como artista gráfico
está presente na série de posters que são versões de outras composições, busca da
popularização e alcance via distribuição em massa, nos seus temas de composição, colagens e
letreiros que insere sobre as imagens. E finalmente os componentes característicos da arte
contemporânea se apresentam na leveza das abstrações que obtém com velaturas, cores,
profundidades, luzes, transparências e a modernidade da técnica. Seu ponto de partida e de
chegada é a fotografia. Nota-se não apenas a capacidade de realizar arte abstrata, mas também
uma coerência de estilo e no discurso por trás da obra. Existe um desejo libertador nesta arte: a
representação do plano etéreo. Suas composições sugerem realidades paralelas e refletem uma
busca pelo mapeamento de visões espiritualísticas.

Ricardo Ramalho
25/10/2015